segunda-feira, setembro 05, 2005

A Digitalidade

Reflexão construída sobre os textos
From static plastic to dynamic fluid e
Random or sketchy?

de Mike McCoy

Introdução
As novas tecnologias, as novas tecnologias… o novo mundo, a realidade virtual… e as pessoas que se contaminam deste novo mundo, mas que não se conseguem subtrair, pois claro, da sua filogenia. Está disponível uma nova forma de existência. No processo “natural” de evolução não se vislumbram alternativas. Não é possível evitarmos a digitalidade ou, se preferirem, a idade do digital. Esta nova dimensão promove a multiplicidade de contextos que suporta uma parte cada vez mais relevante da existência dos indivíduos. Os exemplos são óbvios: a WEB, as novas formas de (tele)comunicar, as novas ferramentas… Se atentarmos, por exemplo, nos acontecimentos registados a uma pessoa e dia normais, verificamos que quase todas as situações e tarefas estão embriagadas de processos associados à digitalidade. A globalização é o resultado mais imediato. Enquadrando esta actualidade no “design” podemos discursar algumas cogitações.

Digitalidade, corpo e emoções
Efectivamente assumimo-nos parte integrante da digitalidade; reclamamos até a existência em “meio digital”. Aí, sem qualquer pudor, mergulhamos também o corpo disponibilizando-o ao meio. Não o fazemos de ânimo leve; fazemo-lo porque não nos conseguimos despojar dele. Será o corpo o parente pobre do ser? É de certeza o mediador…

Não tendo o corpo evoluído neste meio e evoluindo o meio a velocidades que jamais permitirão ao corpo adaptabilidade “natural”, há que conquistar o conforto essencial para que a co-existência de ambos e as suas múltiplas relações subsistam. Esta conquista revela-se não só no corpo mas através dele (não fosse ele o mediador, a última interface). Uma das variáveis da equação que veicula esta aquisição de conforto é, sem dúvida, a dimensão emocional dos objectos. O que M. McCoy sugere é precisamente isso. Num estado em que o meio se define demasiado racional, frio; em que o ser é impregnado de desconfianças, a proposta é a de aumentarmos o carácter emocional dos nossos projectos. Mais do que uma possibilidade será uma necessidade potenciarmos as relações emocionais entre o ser e o objecto. Depois do domínio mecânico e técnico, lançamo-nos na conquista do emotivo. Apostamos em projectar possíveis soluções às necessidades ou exigências emocionais dos utilizadores considerados.

Concluindo (sem no entanto encerrar)
Uma estratégia possível é o aperfeiçoamento das interfaces. Tentar encurtar as distâncias, físicas e emocionais, entre objecto e ser. Neste caso, parece-me inevitável, atractivo até, intervir no corpo; potenciá-lo enquanto médium da relação, metamorfoseá-lo, explorá-lo… Intervindo no corpo minimizamos a necessidade de intervir nos objectos ou pelo menos, de repetir essa intervenção noutros objectos. Pese embora a dificuldade, explicável, de transbordarmos os limites do nosso corpo (do corpo biológico e emocional). Será imperativo algures durante este processo (deverá ser já) reclamar, reivindicar capacidades críticas e cognitivas do ser. É essencial que o projecto cumpra com estas necessidades, assim como através delas proceda à educação social dos públicos, exaltando a responsabilidade intrínseca do designer.

De qualquer forma, este percurso, embora iniciado, está longe ser percorrido. As ferramentas digitais ainda não substituíram as tradicionais. Para quando a excomungação dos lápis e do papel? Ainda assim, se um dia isso suceder (um dia sucederá!), será bom percebermos que nada se perdeu. Simplesmente evoluiremos a ferramenta. Mau seria perdermos o verbo ou delegá-lo…

José Fernando Pinto


Comentários:
É com fervor que aqui deposito algumas palavras com o intuito de fomentar mais discussão acerca do texto A Digitalidade, de José Fernando Pinto.

De facto a evolução não é uma negação dos meios tradicionais. A meu ver, é antes uma melhoria da eficácia operativa e talvez emocional dos mesmos. Para muitos de nós, acredito que neste momento seja complicado encarar a substituição ou até mesmo o abandono do lápis e do papel. Talvez nunca o faremos… Pelo menos enquanto que a nossa aprendizagem de expressão escrita e visual, continuar a depender destes dois elementos.

O lápis e o papel, desde tenra idade que são ferramentas que nos permitem desenvolver a nossa forma primordial de comunicar, através da escrita e do desenho. Como tal, a nossa forma de projectar e de expormos as nossas ideias em fases mais avançada da nossa contínua aprendizagem, ainda depende largamente destes elementos, sendo essa dependência notória em disciplinas como o design, a arquitectura ou a escultura. Assim sendo, continuamos a encarar o lápis e o papel como sendo os meios mais adequados para se esquiçar ideias através de técnicas simples e rápidas.

Admito no entanto, que em gerações próximas, o lápis e o papel poderão ser gradualmente substituídos por meios e técnicas digitais. Talvez estejamos já a ser os mentores desta mudança, sem no entanto nos estarmos a dar conta disso. Talvez estejamos já a sentir a vontade e a necessidade de o fazer. Ou, pura e simplesmente, talvez estejamos a ser forçados a fazê-lo por diversas circunstâncias, lutando no entanto, para não rompermos com o cordão umbilical que nos une aos nossos ensinamentos mais tradicionais!

A meu ver, esta mudança de metodologia de trabalho e de técnica expressiva dependerá essencialmente da forma, da velocidade e da eficácia com que a comunicação e os processos de fabrico em termos universais evoluírem no futuro, assim como, da nossa capacidade em desenvolver e aplicar estas novas competências. À semelhança do que ocorreu com outras tecnologias no passado, a inclusão do computador no design tem evoluindo no sentido da descoberta e exploração de capacidades específicas e inovadoras face as técnicas tradicionais, onde o lápis e o papel estão incluídos.

Nos últimos anos, a interferência da tecnologia digital tem sido largamente discutida na prática e na teoria da disciplina, sendo constantemente questionadas as fronteiras e os métodos que convencionalmente definem os territórios e modos de intervenção. As mais recentes gerações de designers têm vindo a desenvolver e fortalecer uma significativa relação com o computador. Há já mesmo uma significativa dependência com o digital. Hoje, para uma grande maioria de designers, é impensável não incluírem o digital no processo de design. Para além de adoptar novas técnicas e meios digitais para projectar e expressar as suas ideias, os designers têm revelado também uma significativa preocupação na execução/produção dos projectos, onde procuram através do digital, minimizar os prazos de execução, os custos produtivos, procurando paralelamente aumentar os níveis de qualidade e produtividade efectivas.

As técnicas e metodologias digitais quando devidamente assimiladas e aplicadas, têm permitido alcançar soluções, que operativamente representam uma significativa redução de tempos e custos de projecção, favorecendo a exequibilidade de projectos até então difíceis de concretizar dado a sua complexidade. Actualmente, o computador permite interferir em qualquer fase do projecto de design e até mesmo no processo de fabrico. A utilização e combinação destas potencialidades são na prática muito diversas. O hardware e o software, ou seja, os elementos de interacção digitais, têm vindo a ser largamente utilizados no design industrial, no design de interiores e design gráfico.

Por exemplo, há já alguns anos que o desenho técnico resultante do estirador foi substituído pela linguagem 2D utilizada no CAD (Desenho Assistido por Computador). A linguagem 3D vem sendo também uma ferramenta indispensável para a execução de projectos em algumas vertentes do design, como forma prática e eficaz de conceber, analisar, simular e construir projectos. Para além de ser ter tornado numa linguagem mais simples e objectiva, no design industrial, o desenho 3D tem facilitado a percepção e concepção do projecto, aliando-se a análises, cálculos e simulações computacionais que permitem detectar possíveis anomalias através de sistemas CAE (Engenharia Assistida por Computador), onde a correcção atempada em fase projectual permite de forma prática e rentável, a construção do projecto através de sistemas CAM (Manufactura Assistida por Computador) que favorecem a produção complexa, com notória eficiência produtiva e qualitativa.

Se excluíssemos a partir deste momento o lápis e o papel no processo de aprendizagem ou até mesmo no processo projectual, não acredito que o design desaparecesse ou ficasse incompleto. Muito pelo contrário, julgo que ficaríamos extremamente surpresos com os resultados que pudessem surgir de uma projecção puramente digital. Aliás, nesse sentido, têm-se efectuado experiências extremamente interessantes, onde através de desenhos realizados unicamente com meios digitais CAD-CAM, se têm fabricado produtos bastante complexos e exequíveis em termos de prática industrial. São novas formas de projecção e execução, que revelam ser mais eficazes e práticos, do que os meios tradicionais de projecção e execução (entenda-se por produção/fabrico).

Se atentarmos, verificaremos que os esquiços (ponto de partida do projecto) são de facto uma óptima técnica para se explorarem ideias. No entanto, estes têm sido dificilmente interpretados pela maioria, incluindo aqueles que nos solicitam o trabalho. Para além de pouco precisos, eles têm que ser apresentados e reforçados com argumentos, dado ao facto de serem abstractos e despojados de detalhes que valorizam o teor projectual. Mesmo assim, eles têm sido necessários para desenvolvermos o nosso trabalho. Foi essa a nossa aprendizagem e essa tem sido a nossa forma de comunicar, ou seja, essa tem sido a nossa linguagem! Mas, se adoptássemos apenas a técnica de esquiçar directamente no computador, não haveria também eficácia na exploração de ideais e na forma de as comunicar?

A aplicabilidade do lápis/papel na fase projectual irá ainda perpetuar nos próximos tempos. No entanto, tal como o José Pinto, estou convicto que esta metodologia será gradualmente abandonada com o aprofundamento da aplicabilidade de novas técnicas influenciadas pelas tecnologias digitais que existem e que irão ainda surgir. A aceleração do abandono do lápis e do papel irá depender do grau de assimilação e adaptação de novas metodologia inerentes aos meios digitais, sobretudo a partir do momento que o meio académico for capaz de as transpor para a realidade industrial.

Mesmo que hajam entraves para que tal aconteça, a substituição de técnicas de expressão inerentes ao lápis e ao papel irão ocorrer com a aplicação de novas competências mesmo que sejam desenvolvidas a “revelia” dos actuais sistemas de aprendizagem tradicional. Hoje, existem já hardwares e softwares eficientes que revelam ser mais práticos do que o lápis e o papel (pelo menos em algumas vertentes do design). O projecto não necessita necessariamente de incluir o lápis e o papel para que surja o resultado. As tecnologias CAD/CAE/CAM são exemplo disso. O digital está ai para ficar, e é ele que comanda o início deste novo século. Não vale a pena refutá-lo. É preciso compreende-lo e empreende-lo como forma de evolução, sendo este um sinal dos novos tempos que se avizinham.

Esperando ter contribuído de forma positiva para o alargamento do debate, gostaria de ler a opinião de outros colegas pertencentes as diversas vertentes do design, para melhor entendermos e reflectirmos acerca de qual a influência do digital no futuro, assim como no nosso percurso que nos espera.

Daniel Monteiro
Setembro de 2005
 
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